sábado, 15 de outubro de 2011

Bah, Tchê, Tri e um pouco de "chileno"



Em quase uma semana fui transportada prum mundinho verde-vermelho-amarelo-branco que só os gaúchos - principalmente os de PoA - entenderiam.
Passei dias ouvindo aquele sotaque bem cantadinho, com todos os vícios de linguagem e regionalismos que se tem direito. Ouvi um espanhol chileno com aquele excesso de vogais marcadas na oralidade da fala, daqueles que chega a arrepiar, a dar nervoso. Nada incompreensível. Nada desagradável. Mas me fez pensar em como o carioca é "exxxxxculhambado" com seus excessos verborrágicos, cheios de palavrões e intimidades, cheios de hipérboles quase inimagináveis, e de uma malemolência digna de sambistas malandros de Lapa mesmo.
Fiquei pensando na linguagem e me dei conta de como a cultura regional, a identidade mesmo do gaúcho, do carioca ou do chileno, se distinguem a começar pela linguagem. A estrutura da gramática é sempre soberana, semi-imutável, uma dama de ferro. Mas a oralidade da língua, o processo de significação e ressignificação dos símbolos e correlatos das palavras, todos os detalhes da casualidade da fala, do dia-a-dia, tudo ficou nítido pra mim.
Não dá pra alterar a postura cultural de um índio mapuche, por exemplo, mesmo que ele estivesse no Rio e soubesse sambar no carnaval, ou que estivesse nos pampas, de bombacha, espora e boleadeira, descansando da cavalgada tomando chimarrão.
Tanto o conceito de Langue e Parole, utilizado por Saussure; quanto o de Energeia e Ergon, utilizado por Humboldt estavam ali, e eu me dando conta aos poucos. Não que não tenha percebido os mecanismos agindo antes, mas fiz uma relação da linguagem com a fala e a cultura, sistema de crenças, geografia, historicidade...Enfim, passaram-se tantas coisas pela minha cabeça que ficaria impossível descrever todas.
Mas, uma das mais marcantes foi a sensação de que através da fala, da reprodução daquele conjunto de signos, símbolos, poderíamos desenhar personagens, como se fosse um desenho animado. Como se pudéssemos prever o estereótipo através do sotaque correspondente ao local.
O espanhol que se fala no Chile obviamente é diferente da Argentina, da Bolívia, do Uruguai... E, sinceramente, dá pra fechar os olhos e imaginar uma pessoa de pele levemente escura, com umas roupas meio grossas, de lã, andando em Lhamas, ou seja, o estereótipo do índio Mapuche.
O português do gaúcho é uma coisa mais fria, mais organizada, e sem tantos palavrões. Dá pra ver a "justeza" do gaúcho, a atenciosidade e a coragem também. Parece um gaúcho da fronteira, tocando um vanerão na "gaita" (pra gente sanfona).
O português do carioca bem arrastado, bem "que se foda", cheio de "x" e com muitos palavrões me faz pensar num cara moreno de praia, bermuda e havaianas, óculos de sol, andando arrastado por Madureira, por exemplo.
É tudo estereótipo, tudo senso comum, conhecimento basal... Que foi produzindo uma imagem, aos poucos construída com a associação dessas leituras culturais associadas à fala e à cultura. Isso aí que eu comecei a achar incrível.
E aí foi isso... Bons dias de flerte com o sotaque gostosíssimo de PoA e alguns momentos confusos com o espanhol chileno. E vou reclamar nada! Foi é muito bom.
Dessa quase uma semana, dá pra tirar lições de ouro: ainda tenho muito que ler sobre antropologia da linguagem... E também fazer um recorte menor, mais específico, da próxima vez.

E MAIS: pra quem não sacou a história da Langue e da Parole, por exemplo, aqui tem um linkzinho que vai ajudar um pouco a entender a linha inicial de raciocínio. Quanto a Energeia e Ergon, é quaaaaaaase quaaaaase a mesma coisa, dá pra entender melhor a relação aqui.

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Desesperança

É tanta mágoa, é crueldade, é descaso, é tristeza, é angústia...
Acontece ao mesmo tempo, ou assim que um acaba, começa o outro.
Não tem mais liberdade, não tem mais dinheiro...Então não tem mais querer.
Não tem mais mãe, nem pai, não tem conexões com pessoas.
Não tem amor, não tem sexo, paixão ou tesão.
O pensamento frio, racional, ganhou do sentimento.
Não há nada que não seja lógico, exato ou aceitável.
Hoje a desesperança já pode acontecer.
Se tinha que ser a última a se ir, então que se vá.
Não há mais nada a se perder.